BLOG DA PASTORA ZENILDA


Pra. Zenilda Reggiani Cintra
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terça-feira, 16 de setembro de 2014

“TEMOS UMA GRANDE BATALHA PELA FRENTE” (Entrevista Revista Cristianismo Hoje)

Edição no. 40 – Abril/Maio 2014

“Para Zenilda Cintra, as igrejas que rejeitam a ordenação pastoral feminina atribuem papel inferior às mulheres”

Entrevista por Carlos Fernandes

A pastora Zenilda Cintra, da Igreja Batista Esperança, em Taguatinga, DF, tornou-se nacionalmente conhecida ao ser recebida como membro da Ordem dos Pastores Batistas do Brasil, OPBB (Houve um equívoco. Não fui recebida pela OPBB.  Veja: EU NÃO SOU A PRIMEIRA PASTORA BATISTA! )Nesta conversa com CRISTIANISMO HOJE, ela fala sobre seu chamado e ministério e avalia as controvérsias acerca da ordenação pastoral feminina.

CRISTIANISMO HOJE – O reconhecimento de sua ordenação pastoral pela Ordem dos Pastores Batistas do Brasil (OPBB) pode inaugurar um período de mudanças de postura em relação ao pastorado feminino na sua denominação?
ZENILDA REGGIANI CINTRA – Não se trata, apenas, do reconhecimento da minha ordenação, mas de uma decisão que trará muitas mudanças a médio prazo. Acredito que tudo é um processo gradativo que começou há muitos anos. Temos cerca de 180 pastoras nas igrejas batistas e a decisão da Ordem dos Pastores Batistas do Brasil resolveu parcialmente a questão. Agora, cada seção da Ordem, que é composta de pastores de um estado ou região, ainda irá decidir se filia ou não as pastoras. À medida que as OPBBs forem decidindo pela filiação, haverá muitas mulheres ordenadas. Penso que temos uma grande batalha pela frente. Recebo muitos e-mails de mulheres que estão com o seu processo todo pronto, somente aguardando essas decisões.

Neste sentido, a senhora se sente uma espécie de pioneira, uma representante do segmento feminino na igreja?
Acredito que o meu papel tem sido o de ser uma voz entre as pastoras para a estrutura denominacional. Quando surgi no cenário batista como pastora, por causa do meu trabalho anterior na denominação, ninguém poderia dizer que eu era uma aventureira. Até aquele momento, o assunto era tratado por homens como se a questão do pastorado feminino fosse única e exclusivamente uma decisão deles. Então, acredito que Deus usou tudo isso para que as pastoras começassem a ser ouvidas. Comecei a trabalhar com informações, divulgando o número de pastoras à medida em que crescia e também textos e estudos favoráveis ao pastorado feminino, a fim de provocar uma reflexão, uma mudança de mentalidade. Lógico que não trabalhei sozinha em tudo isso. Houve o papel imprescindível das pastoras que foram lutando, da maneira como podiam, em seus espaços. Tive também um apoio decisivo do diretor-geral da Convenção Batista Brasileira [CBB], pastor Sócrates de Oliveira, que abriu portas para as pastoras e sempre as tratou com muito respeito.

Como foi a sua trajetória?

Nasci em um lar cristão, batista. Meu pai era evangelista e cuidava de igrejas junto com a minha mãe. Eu e meus quatro irmãos sempre fomos muito envolvidos com a igreja, e foi nesse ambiente que desenvolvi a minha fé e meus talentos. Com 19 anos, fui estudar no Instituto Batista de Educação Religiosa, no Rio de Janeiro. Quando me formei, em 1980, meu discurso como oradora da turma já foi a respeito da vocação da mulher. Recebi um convite para trabalhar na sede da Junta de Missões Nacionais da CBB. Lá fiquei durante mais de sete anos, inclusive gerenciando a área de Comunicação. Durante os anos que se seguiram, li e estudei muito a respeito de ordenação feminina, até que aceitei que o chamado de Deus era para mim, também. Quando me casei,  acompanhei meu marido, o pastor Fernando Cintra, em várias igrejas no estado de São Paulo. Em 2004, fui ordenada na Igreja Batista Curuçá, em Santo André. Nos últimos três anos, estamos na Igreja Batista Esperança, em Taguatinga (DF), que votou para me receber como pastora. Paralelamente ao trabalho na igreja, atuei também em outras instituições denominacionais, como a Convenção Batista do Estado de São Paulo, Diretoria da União Feminina Missionária Batista do Brasil e outras.

Sua ordenação seguiu a tradição batista, ou seja, foi examinada por um concílio de pastores e depois consagrada?
Foi realizada uma assembleia na igreja, fizeram perguntas e votaram um documento de ordenação. O concílio de pastores não aconteceu porque estávamos em São Paulo, um estado muito resistente, na ocasião, às pastoras, e não queríamos problemas para a igreja. Mesmo assim, tivemos algumas dificuldades com a liderança local. Agora, depois que houver a votação aqui no Distrito Federal, então deverei, depois de 34 anos de formada, passar por um concílio de pastores para cumprir as exigências da OPBB.

Como será, daqui por diante, sua participação junto aos demais pastores batistas em convenções e outros eventos denominacionais? A senhora acha que pode haver alguma cobrança ou constrangimento?
Não tenho dificuldade de convivência, inclusive com os que são declaradamente contra pastoras. Muitos pastores me tratam com respeito e amor cristão, e faço o mesmo. Mas há uma parcela de pastores que, por não quererem me chamar de pastora, nem se aproximam e agem com indiferença a meu respeito. Às vezes, isso dói, mas estou há tanto tempo enfrentando essas dificuldades que supero, recebendo o consolo de Deus. As igrejas batistas, de modo geral, por causa da sua historicidade, são consideradas como sérias na questão do ensino e obediência aos princípios bíblicos. Portanto, acredito que o fato de os batistas aceitarem pastoras influenciará positivamente outras denominações, especialmente as históricas.

Boa parte dos evangélicos que se opõem ao sacerdócio feminino usam os escritos de Paulo para justificar sua postura. Por outro lado, os defensores argumentam que deve haver uma contextualização do texto e regras bíblicas aos tempos modernos. Quem tem razão?
A igreja é um reflexo da sociedade e, infelizmente, muitas vezes ela não se sobrepõe aos conceitos sociais que lhe são impostos. A atribuição de um valor menor às mulheres, ou o impedimento a que elas sejam cidadãs plenas, tanto da sociedade quanto do Reino de Deus, é algo comum de se encontrar nas igrejas, disfarçado de obediência à Bíblia. Esses conceitos pseudorreligiosos de supremacia masculina trazem muito sofrimento às mulheres e às famílias. Por mais que a igreja tenha esse discurso de dominação em amor, isso não existe. Dominação sobre outro ser humano é o contrário do amor. Falta, em nossas igrejas, estudos de gênero, do papel da mulher à luz dos ensinos de Jesus, na perspectiva de igualdade na diversidade, para trazer um ambiente saudável para as igrejas e as famílias. Tudo é uma questão da interpretação que se dá aos textos. Os que são contrários à ordenação feminina dificilmente olham para o ensino geral das cartas de Paulo e a presença forte de mulheres em seu ministério, com diversos tipos de funções. Os favoráveis ao pastorado feminino interpretam o conjunto das Escrituras à luz dos ensinos de Jesus e fundamentam nisso, e não no movimento feminista, a ordenação de pastoras. É lógico que o feminismo propiciou um novo tempo de reflexão a respeito do papel da mulher – e, se hoje elas votam, estudam, trabalham e têm direitos no casamento e sobre filhos, isso se deve ao feminismo, tão execrado no meio evangélico, inclusive por muitas mulheres que se esquecem que elas próprias expressam sua opinião como resultado desse movimento.

Defender o pastorado feminino, então, é uma questão feminista?
Não. Acho manipulador e desonesto esse argumento de que pastoras e feminismo são a mesma coisa. Não são. O chamado de Deus para mulheres está respaldado na Palavra de Deus. O movimento feminista, com suas conquistas que alcançaram todas as mulheres, criou um ambiente propício para trazer novamente a possibilidade do exercício do ministério pastoral por mulheres, o que foi comum no início da Igreja cristã, segundo os mais avançados estudos das ciências bíblicas. As conquistas sociais e políticas da mulher refletiram-se eclesiasticamente e criaram um ambiente favorável para se discutir novamente o papel feminino na Igreja, tão sufocado a partir do quarto século. Porém, essa não é a base para a aceitação de pastoras que, repito, é a Palavra de Deus. Como as igrejas, de modo geral, podem ficar indiferentes ou reforçar essa crença de inferioridade feminina? Acredito que a ausência de mulheres nas instâncias de liderança da Igreja deixa incompleta a ação em favor das pessoas. A radicalidade e a intolerância fazem com que, com o tempo, as pessoas se desinteressem pelo discurso religioso – acho que é por isso que muitos segmentos religiosos diminuem.

Nas sociedades modernas, as mulheres estão ocupando muitos espaços. Qual o efeito disso para a tradiconal identidade masculina? Os homens, antes dominadores, estão ameaçados por esse poder feminino?
Homem e mulher são duas modalidades do ser humano, macho e fêmea. O ideal de Deus, ordenado na criação, é que ambos sujeitassem a natureza, e não um ao outro. O pecado originou a dominação do homem sobre a mulher, anulada na cruz, e nossa cultura tende a colocar a identidade masculina firmada nessa dominação.  O fato de a mulher exercer toda a sua potencialidade, quer no ambiente profissional, acadêmico ou eclesiástico, não deveria interferir na identidade masculina. O homem deve procurar exercer o propósito para o qual Deus o chamou e desenvolver suas potencialidades, seja em que área for, como também a sua sexualidade masculina. Há um certo consenso em se pensar que os homens ficaram um tanto confusos com esses novos papéis da mulher, mas hoje há um olhar especial também para eles, inclusive no meio evangélico, com lançamentos de livros e ministérios voltados para esse público. Esperamos que esse novo olhar venha ajudar esse homem a perceber e se apropriar da sua identidade respaldada na Bíblia, e não resgatar comportamentos e exigências que oprimiam, inclusive, a própria figura masculina.

O papel da mulher, sobretudo a mulher de pastor, nas igrejas evangélicas, concentra-se normalmente em atividades como aconselhamento, educação bíblica, apoio às famílias, trabalho com crianças etc. Essas tarefas, embora importantes, não reduzem a atuação feminina na igreja a uma posição secundária?
Acho que cada mulher tem o seu chamado. Esposa de pastor é um papel extremamente digno e pouco valorizado em muitas igrejas. Há muitas heroinas no meio evangélico chamadas de esposas de pastor. Tenho muito respeito por cada uma delas porque eu também, além de ser pastora, sou esposa de pastor. Então, sei perfeitamente bem o papel fundamental que a maioria delas exerce para que o marido tenha um ministério bem sucedido. No entanto, há muitas esposas de pastor vocacionadas por Deus para serem pastoras e tiveram seus chamados independentemente do tempo e do espaço do marido. Não é uma questão de se sentirem diminuídas, mas de serem impedidas de exercer seu ministério plenamente.

Quais as vantagens de uma pastora sobre um colega do sexo masculino no trato com a congregação e nas atividades eclesiásticas?
Não acho que haja vantagens ou desvantagens. Há uma complementaridade. Homens e mulheres, trabalhando juntos, constituem uma parceria saudável para a igreja e para o Reino de Deus. Não acredito que um seja melhor que outro, mas que se completam, fornecendo visões diferentes – masculina e feminina – para o ministério da igreja e para apascentar o rebanho.

O que a senhora espera, tanto para o seu ministério como para o de outras obreiras?
Sonho com o dia em que qualquer mulher, chamada por Deus, em qualquer lugar deste país, tenha todas as condições e incentivo para desenvolver a sua vocação, preparar-se adequadamente, ser consagrada e servir a Deus e às igrejas batistas do Brasil no ministério pastoral. Entendo a luta de cada uma, mas espero que não desistam. Temos muitas barreiras a enfrentar, quer institucionais ou ministeriais, mas precisamos permanecer firmes, obedecendo ao chamado de Deus. Estamos trilhando o caminho do pioneirismo e, por isso, pagamos um preço que, às vezes, parece muito alto, em termos de oposição e até contra a nossa dignidade. Penso que a mulher que tem um chamado precisa tanto dialogar como lutar para conquistar seu espaço no lugar em que Deus a colocou. Caso essa luta não tenha resultados, então a mulher deve procurar um outro lugar, mas nunca deixar de exercer a sua vocação.

Um comentário:

  1. Pastora eu acompanho a lista do vital, é de doer a ignorância e a frieza dos Pastores que de nada entendem e ainda "se acham" rsrs , em tempo indico a leitura de TEOLOGIA DAS MULHERES, a quem Deus revelou seus mistérios. - fonte editorial http://www.livrariasaraiva.com.br/produto/4241725/teologia-das-mulheres-a-quem-deus-revelou-seus-misterios/ EXCELENTE leitura, conciso, denso, uma estudo profundamente preparado, percorrendo toda a Biblia em detalhes. fica a dica :) abraço

    welisson

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